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Os eternos segundos

Texto: Alex Ricci (www.motox.pt)

Fotos: MotoGP, WorldSBK, Lisa Daniel Photography e MotoX.pt



“Segundo é o primeiro dos perdedores” é uma frase famosa de Enzo Ferrari que condena com brutal ironia todos aqueles que se aproximam da vitória e que temos ouvido utilizar ao longo do tempo como uma provocação, provavelmente após um triunfo esmagador do vencedor do dia.


Mas o que é impiedosamente verdadeiro e o que não deve ser levado a sério numa tal afirmação?


Vindo de uma personagem como o ‘Dragão’, sempre a competir contra todos com as suas ‘máquinas’, não é demasiado surpreendente e tem um toque peculiar, mas a verdade é que entre os grandes segundos classificados há uns poucos tão importantes como um verdadeiro vencedor.


Randy Mamola com 15 anos de idade, acabadinho de chegar dos EUA.

Pela sua idade foi impedido de alinhar na edição de 1974 das 100 Milhas de Imola, em Itália


Randy Mamola, o funâmbulo das duas rodas


O primeiro a lembrar é certamente Randy Mamola, um piloto que passou os melhores anos da sua carreira no MotoGP de 1979 a 1992 e especialmente na classe das 500.


Nascido em San José, no Condado de Santa Clara, Califórnia, ele alcançou um total de treze vitórias na categoria principal, um feito que teria sido suficiente para ganhar pelo menos dois títulos mundiais na década de 1980.


Mamola (pronunciado com o acento no o), foi um funâmbolo em duas rodas, capaz de números espetaculares em qualquer pista e em qualquer fase de uma corrida, que ficou na história por terminar quatro vezes em segundo e duas vezes em terceiro, acariciando o campeonato mundial sem nunca o ganhar.


Randy Mamola com a NSR500 da Rothmans Honda, em Assen, em 1985


A primeira ocasião foi na temporada de 1980, com uma Suzuki, quando teve de se render ao ‘marciano’ Kenny Roberts, que estava a ‘preparar’ o seu terceiro título consecutivo, enquanto que em 1981, na mesma moto, terminou em segundo lugar atrás de Marco Lucchinelli, no seu único triunfo na Suzuki da equipa Gallina.


O seu terceiro segundo lugar veio em 1984, quando numa Honda foi derrotado na tabela final por Eddie Lawson, para repetir três épocas mais tarde, desta vez numa Yamaha e atrás de Wayne Gardner.


Randy Mamola numa famosa batalha de bolas de neve com Jean-François Baldé.

Estávamos em 1982 e nevava no circuito de Salzburgring, na Áustria


Os dois terceiros lugares vieram nas temporadas de 1983, quando foi derrotado por Freddie Spencer e Roberts, e em 1986, atrás de Lawson e Gardner.


Em resumo, é bastante claro que para Randy, o encontro com estes pilotos foi decisivo para os seus resultados, mas ele continua a ser um dos mais aclamados e lembrados da escola americana e da era dourada da classe rainha.


Aaron Slight projetado pela RVF750 RC45 da Castrol Honda, durante a segunda manga da ronda de Hockenheim, em 1997


Aaron Slight, o guerreiro Maori


Aaron Slight é, por direito próprio, o piloto de motociclismo neozelandês mais conhecido dos últimos trinta anos.


Talento na pista e personagem dentro e fora do ‘paddock’, ele foi um dos melhores artistas no início da era Superbike, aproximando-se do título duas vezes e terminando em terceiro em quatro ocasiões (três das quais consecutivas).


Natural de Masterton, estreou-se cedo, ganhando os Campeonatos Australiano e Pan-Pacífico em 1991 e as 8 Horas de Suzuka por três vezes, entre 1993 e 1995.


Em Superbike, começou com a Bimota, mas foi com a Kawasaki que alcançou a sua primeira vitória.


Mudou para Honda e, mais uma vez, terminou em terceiro lugar de forma tripla.


Slight com John Kocinski, que viria a ser campeão mundial, e Sinichi Itoh, à sua direita.

Do seu lado esquerdo está Yuichi Takeda, o quarto elemento que a Honda Castrol fez alinhar na ronda caseira de Sugo, no Japão.


Foi em 1996 que lutou pelo seu primeiro título e com apenas uma vitória e onze pódios teve de ceder a liderança a Troy Corser.


No ano seguinte foi terceiro pela quarta vez, enquanto em 1998, com cinco vitórias e cinco segundos lugares nada pôde fazer contra o ‘Rei’ Carl Fogarty e terminou em segundo lugar pela segunda vez.


Apelidado de ‘guerreiro Maori’ devido às suas origens, ou simplesmente de ‘Kiwi’, Slight tinha um corte de cabelo à moicano com uma crista de cabelo tingida de verde ou vermelho e exibia um físico de surfista.


A sua crista de moicano era a imagem de marca de Slight.

Podia mudar de cor de uma prova para a outra.

Estávamos em 1996.


Habituado a usar o número ‘3’ no seu capacete, após três terceiros lugares consecutivos mudou-o para ‘111’, quase como que para exorcizar as suas três oportunidades perdidas, sem saber que os seus anos de eterno segundo lugar só tinham chegado a meio caminho.


Curiosamente, de 2007 a 2011 e na categoria Superbike, Rubén Xaus também usou ‘111’ na sua carenagem, tal como Luca Ottaviani atualmente, na classe Supersport do CIV, o campeonato italiano de velocidade.


Tom Sykes com a GSX-R1000 da Rizla Suzuki com que alinhou pela primeira vez no Mundial de Superbike, na passagem por Donington em 2008.

Aqui ‘embrulhado’ com Leon Haslam, perante o espetador Cal Fogarty.


Tom Sykes, por pouco que não era um eterno segundo


Ele poderia ter sido um segundo eterno, e em parte foi, mas Tom Sykes conseguiu.


O piloto de Huddersfield foi o único a trazer o título de Superbike de volta à Kawasaki após um jejum de 20 anos.


Ele também teria tido sucesso no ano anterior, mas uma série de combinações e uma pontuação reduzida para metade na ronda de Silverstone significou que o inglês perdeu o título para o italiano Max Biaggi.


Atenção, o corsário de modo algum teve demérito, mas é curioso como um piloto pode terminar em segundo lugar por apenas meio ponto de diferença.


A sua estreia no campeonato para as motos derivadas da série data de 2008, quando participou em duas corridas como ‘wild-card’ com a Suzuki GSX-R1000 com a qual correu no campeonato britânico.


Tom Sykes já com a Kawasaki que o levaria ao título em 2013.

Aqui ainda os resultados eram algo penosos, como nesta passagem por Assen, em 2010.


Em 2009 tornou-se um colega de equipa permanente de Ben Spies na equipa oficial da Yamaha.


Ao lado do texano, que devorou os seus rivais ao ganhar o título, Tom quase sempre ficou entre os dez primeiros sem nunca chegar ao pódio.


Parecia ser uma época opaca, sem demasiadas pretensões, mas no ano seguinte, quando mudou para a Kawasaki, os resultados caíram drasticamente e, apesar de ter uma alcançado uma vitória, durante duas épocas ele terminou em décimo terceiro e décimo quarto respetivamente.


A ZX-10R não parecia ser uma moto vencedora, em vez disso, em 2012 vieram quatro vitórias e nove pódios.


A passagem de Tom Sykes pela BMW Motorrad como piloto oficial teve muitos altos e baixos, como a queda no arranque da corrida de Domingo em Magny Cours, que colocou a duas máquinas oficiais fora de prova logo na primeira curva.


Com o maior número de pódios ganhos, não venceu o campeonato, conformando-se com o segundo lugar, o que parecia ser uma maldição.


Felizmente, em 2013 Sykes ganhou o Campeonato Mundial de Superbike com nove vitórias e nove pódios.


A segunda coroa de louros para a Kawasaki depois de Scott Russell, em 1993, foi o prelúdio do ciclo de seis títulos consecutivos de Jonathan Rea, de 2015 a 2020.


Com a menor liderança de sempre na classificação de 2012 da Superbike, se não tivesse ganho no ano seguinte, Sykes teria tido mais probabilidades de ser lembrado por aquele falhado campeonato mundial por meio ponto, do que pelas suas belas vitórias.


Cirillo ‘Nello’ Pagani com a Mondial 125 que levou ao titulo mundial em 1949.


‘Nello’ Pagani, mais conhecido pelo campeonato que não venceu…


Concluamos com um salto no tempo e vamos até 1949.


As regras do Campeonato Mundial de Motociclismo afirmaram: “Pour le meilleur tour accomplì par un concurrent classé: 1 ponto” e esta regra foi decisiva na atribuição do primeiro título histórico a Leslie Graham, na AJS, que no final da época tinha marcado 28 pontos, um a menos que Nello Pagani, o piloto principal de Gilera, que viu o seu primeiro campeonato mundial histórico na classe 500 escapar.


Mudando do Campeonato Europeu para o Mundial, a língua oficial em que o regulamento foi escrito era o francês.



Na tradução italiana foi cometido um erro em que se pensava que a melhor volta global da prova contava se o piloto se classificasse.


A diferença entre as duas versões não valeu o apelo da Federação Italiana e, com 30 pontos, Graham tornou-se campeão da Classe 500.


Assim terminou o primeiro ano do Campeonato Mundial para Cirillo ‘Nello’ Pagani, de Milão e um dos maiores ases das motos italianas, com uma carreira de quarenta anos, de 1927 a 1967 e uma guerra mundial pelo meio.


Ele estava entre os pilotos mais ecléticos que a história das corridas já conheceu. O seu único título foi ainda em 1949, numa Mondial 125, mas esse campeonato perdido continua a ser famoso.



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